Cérebro viciado: anatomia da compulsão e da necessidade
18 de julho de 2024

Cérebro viciado: anatomia da compulsão e da necessidade

Por NovidadeVindo

O que separa o vício de um hábito comum é justamente o prejuízo que este comportamento causa na vida da pessoa. Em outro exemplo, um adolescente levado pela família à clínica de Nabuco chegava da faculdade e passava a tarde jogando. Suas notas continuaram boas e ele dizia jogar porque seus amigos também jogavam. “Entramos numa área pantanosa. Mas, se a pessoa continua cumprindo bem suas atividades, não temos elementos para dizer que o hábito é prejudicial e se caracteriza como vício, pois o indivíduo tem controle sobre o jogo”, diz o psiquiatra. Essa é uma explicação do porque de, ao chegar em certo ponto do vício, um consumidor pare a se interessar por experiências sexuais reais. Primeiramente, a excitação sexual e o orgasmo induzem uma quantidade de descarregamento de dopamina e opióides endógenos muito maiores do que qualquer outra forma de recompensa natural.

Causas do vício em jogos de azar

Existe uma diferença entre beber socialmente e o abuso do indivíduo alcoólatra. De um ponto de vista psiquiátrico, a dependência de substâncias tem aspectos tanto de transtornos do controle do impulso quanto de distúrbios compulsivos. O primeiro grupo tem um caráter mais psicológico e denota um aumento no nível de tensão ou alerta antes do ato impulsivo; prazer, gratificação ou alívio durante o mesmo; remorso, auto-reprovação ou sentimento de culpa após a conclusão. Já os distúrbios compulsivos compreendem disfunções que cursam com alterações em órgãos de vários sistemas do corpo humano. Este componente caracteriza-se por ansiedade e estresse antes da realização do ato compulsivo repetitivo e, simplesmente, alívio desses sintomas após a consumação desse ato. A diferença é que a ansiedade e o estresse, em oposição ao alerta e à tensão, marcadamente atingem vários órgãos (do que são exemplos a taquicardia, a palidez, sudorese e tremores, entre outros sinais e sintomas da abstinência).

O que um vício causa no organismo

Esta dependência pode acarretar problemas de saúde mental, cognição e relacionamentos, além de levar à falência e à criminalidade. Psiquiatra e diretor clínico do Instituto de Psiquiatria Paulista, Henrique Bottura explica que a dificuldade em deixar um vício também tem a ver com os comportamentos dos dependentes. Segundo ele, alguns são potenciais geradores de risco e se relacionam com sensação de vazio existencial, inadequação a normais sociais, meio ao qual se está inserido, práticas de consumo. “Daí a chamada dependência química, porque a forma como se reage à recompensa acaba muito mais intensa do que o habitual, produzindo até efeitos alucinógenos”, continua Pereira. Ele esclarece, entretanto, que o efeito no organismo varia de pessoa para pessoa, porque as alterações nos circuitos cerebrais são igualmente muito individuais, não seguem um padrão. Além de ativar o sistema de recompensa, alguns fatores de dependência, como drogas mais potentes, ainda modificam os receptores de dopamina ao se ligarem a eles.

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Embora nem todo mundo desenvolva o vício em jogos de azar, é preciso ter cautela ao jogá-los devido às suas características viciantes. A partir do momento em que a pessoa toma consciência de que o comportamento sexual excessivo começa a ocupar espaços e tempos de sua vida e atividades é imprescindível buscar ajuda. A dopamina, neurotransmissor que ajuda as células nervosas a se comunicarem, também é conhecida por ser uma importante substância química no sistema de recompensa do cérebro. “A depender da maneira como se utiliza cocaína, por exemplo, a dependência muda. Você tem desde quem a inala esporadicamente em pó, até quem a injeta e fuma crack”, diz o médico. Ele complementa que quem tende a ser muito impulsivo na obtenção de efeitos e não racionaliza sobre consequências (sinais de transtornos, como bipolar, obsessivo-compulsivo, déficit de atenção com hiperatividade, antissocial) também está sujeito a dependências mais severas.

Como age um viciado?

Uma matéria do National Geographic sobre esse artigo ilustra como as drogas “sequestram” esses caminhos neurais de recompensa, e isso é verdadeiro para todo tipo de vício, seja ele em pôquer, pornografia ou pipoca. O desejo depende de uma cascata complexa de acções cerebrais, mas a ciência defende agora que o seu interruptor é, provavelmente, um pico num neurotransmissor chamado dopamina. A dopamina é um mensageiro químico que transmite sinais pelas sinapses e desempenha diversos papéis no cérebro. Mais relevante para a dependência é o facto de a dopamina poder aumentar aquilo a que os cientistas chamam saliência ou o apelo motivador de um estímulo.

Experimente respirar fundo quando a ansiedade bater ou ligar para alguém querido quando vier a tristeza, por exemplo. O desejo nunca vai embora e é desencadeado por diferentes ganchos ou gatilhos. Pessoas com vício em drogas podem ter sua urgência ativada por uma seringa, ou uma colher, ou mesmo por estar em uma festa ou em determinada esquina.

Atualmente, o distúrbio do jogo compulsivo é diagnosticado por meio do Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (DSM-5), publicado pela Associação Americana de Psiquiatria. Além disso, foi demonstrado que o núcleo accumbens, que desempenha um papel no processamento da recompensa, está envolvido em comportamentos de risco em adolescentes e adultos. Os jogadores compulsivos podem, portanto, apresentar uma maior atividade nestas áreas.

Para quem se identifica com o que foi mostrado no texto ou que conseguem identificar um amigo ou familiar nesse estado, busquem tratamento urgente. A maioria das pessoas não escolhe com o que se viciar de maneira consciente, afinal normalmente ninguém vai querer se aprisionar e ser escravo de um objeto ou ato. Para isso é necessário um tratamento multidisciplinar que trate não apenas do organismo, mas também do psicológico e do social da pessoa. O índice de THC (tetra-hidrocanabinol) substância psicoativa da maconha vem subindo cada vez mais, seja na maconha “natural”, no haxixe ou na maconha concentrada em óleo, onde os índices de THC chegam a absurdos 85%, desse modo cada vez mais pessoas se viciam. Segundo os dados, os fumantes já passam de 1 bilhão de pessoas no globo e a dependência do cigarro esteve diretamente ligada a 7,6 milhões de mortes em 2019 globalmente.

A Wikipédia, por exemplo, define o termo como “um hábito repetitivo que degenera ou causa algum prejuízo ao viciado e aos que com ele convivem”. A Organização Mundial de Saúde, por sua vez, considera um vício como uma doença física e psicoemocional. As pessoas com dependência persistem frequentemente no consumo de drogas para aliviar o sofrimento que sentem quando o interrompem.

Por enquanto, só games foram incluídos em uma lista por causar transtornos. Mas, possivelmente, muitas outras tecnologias deveriam estar nessa lista —ou será que ela então não deveria existir. Até porque, a própria OMS pode considerar algo como uma doença em determinado período e, anos depois, tirar a condição da listagem após descobertas e revisões científicas importantes. Se há lamento de parte da indústria de games pela nova norma da OMS, também há lições a serem tiradas. Recentemente, jogos passaram a cometer abusos para extrair dinheiro de jogadores —e, nesses parâmetros, abriram brecha para serem comparados a jogos de azar.

No pódio, Marc fala sobre a integridade da matéria branca e o fluxo sanguíneo cortical nos jogadores. Do lado de fora da sala, empresas que participam na exposição instalam equipamentos com inovações concebidas para pôr a dopamina dos millennials a circular. A exposição contará com a presença de 27 mil fabricantes de jogos, programadores  e operadores de casino. Para deixar claro, isso não quer dizer que a recompensa gustatória não pode se tornar viciante clínica de recuperação ou causar problemas sérios para muitos indivíduos e gerar preocupações a nível de saúde pública, ou que ela não possa causar mudanças cerebrais dos circuitos de recompensa. Além disso, os transcrições de DNA que produzem proteínas do sistema de recompensa que são importantes para os estados de ânsia que são evocados pela depleção/repleção de sal no organismo são idênticas aquelas produzidas pela ânsia por drogas (Leidke et al., 2011, PNAS).

A compulsão, por exemplo, pode estar ligada a uma crença desenvolvida após uma experiência dolorosa. Essas reuniões acontecem em instituições e organizações não-governamentais voltadas para o tratamento de vícios, como, por exemplo, os Jogadores Anônimos. Nesse período, a pessoa dependente passa por um processo de desintoxicação psicológica em que recebe o auxílio de múltiplos profissionais. Essas sensações despertam sentimentos e pensamentos negativos, podendo colaborar para o desenvolvimento de condições de saúde mental. Essa combinação incentiva as pessoas a jogarem cada vez mais, principalmente quando estão passando por um período ruim em suas vidas.